sexta-feira, 14 de maio de 2010

O QUE UM HC PODE REVELAR


Consulta Processual:

Processo 672927-7 Habeas Corpus Crime
Data 27/04/2010 13:40 - Devolução (Conclusão)
Tipo Despacho
Arquivo PDF Assinado


Habeas corpus n° 672.927-7, da Vara de Inquéritos Policiais do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Impetrante(s): Advogada Andrezza Maria Beltoni Paciente(s): Priscila da Silva Matos
1.
A impetrante alega que a paciente, presa em virtude da decretação da sua prisão temporária, desde às seis horas da manhã do dia 24 de abril último (sábado), estaria sofrendo constrangimento ilegal perpetrado pelo DD. Juiz de Direito da Vara de Inquéritos Policiais, eis que ausente qualquer motivação para a tutela cautelar.
Relatou que a paciente e várias outras pessoas tiveram a prisão temporária decretada para facilitar as investigações de fraudes e crimes cometidos contra o erário do Estado do Paraná, através de um esquema de nomeações e exonerações irregulares de funcionários comissionados da Assembleia Legislativa do Paraná.
A paciente é filha de um dos investigados, João Leal de Matos, funcionário da Assembleia Legislativo há cerca de 22 anos e que seria ligado ao ex-Diretor da Casa, Abib Miguel. A eles é imputado o cometimento dos crimes de formação de quadrilha, peculato e lavagem de dinheiro.
Exceto pela ligação parental com um dos investigados, a paciente reúne condições pessoais favoráveis: é primária, casada, tem residência fixa em São José dos Pinhais (foi presa na sua residência, inclusive), sob o argumento de que não teria colaborado com as investigações.
Todavia, a paciente nunca teria sido intimada para comparecer perante o GAECO, ou a qualquer outro braço do Ministério Público ou ainda a qualquer outra autoridade para prestar declarações.
Ademais, ainda que assim fosse, não estaria a paciente obrigada a `colaborar', posto que tem o direito à não auto-incriminação, cf.
posicionamento já firmado pelo Supremo Tribunal Federal ­ STF.
Habeas corpus nº 672.927-7
Por outro lado, alega a impetrante que, "nem se o quisesse, poderia tê-lo feito, pois sequer tinha conhecimento de que havia qualquer investigação em trâmite contra si" (f. 9).
Sustentou a impetrante que não foi demonstrado, em nenhum momento, que a paciente represente perigo à coleta de indícios ou elementos informativos.
Destacou que não teve acesso, durante o final de semana, à cópia da decisão que decretou a constrição cautelar.
Ainda, sustentou, reiteradas vezes, que o Ministério Público representou pela prisão temporária do maior número de pessoas visando a compeli-las a concordar com a delação premiada.
Por fim, destacou que, embora a paciente tivesse sido presa na manhã de sábado, não foi ouvida por ninguém durante o final de semana, o que afasta a pretensa necessidade da medida.
Finalizou pedindo a concessão de liminar para o fim de se revogar o decreto de prisão temporária imposto à paciente por "não ter colaborado com as investigações", ou para sustar os efeitos da aludida decisão até a decisão de mérito do Colegiado.
2.
Isto posto.
Para a concessão da liminar é necessário que se façam presentes, de forma concomitante, os requisitos do fumus boni juris e do periculum in mora.
É o caso em tela.
Dispõe o art. 1º da Lei 7960/89, que:
"Caberá prisão temporária: I ­ quando imprescindível para as investigações do inquérito policial; II ­ quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade; III ­ quando houver fundadas razões de acordo como qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes: (...) l) quadrilha ou bando (...)"
A prisão temporária da paciente e dos correpresentados foi decretada porque o DD. Juiz singular entendeu ser ela imprescindível para o esclarecimento dos fatos narrados na representação oferecida pelo Ministério Público (f. 10 da decisão proferida nos autos nº 2010.6624-0, correspondente à f. 112/TJ).
Na fundamentação da decisão, o magistrado enumerou os crimes imputados aos representados (formação de quadrilha, peculato, Habeas corpus nº 672.927-7 estelionato, falsidade documental, fraude processual e lavagem de dinheiro). Também historiou as investigações procedidas pelo GAECO ­ Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado desde que a imprensa local noticiou uma série de irregularidades que vinham sendo cometidas na Assembleia Legislativa do Paraná. Tais irregularidades consistiam, basicamente, na nomeação de funcionários comissionados fantasmas com o intuito de desviar recursos do erário. A nomeação destes funcionários fantasmas era feita em Diários Oficiais `secretos', porque não se lhes dava a essencial publicidade dos atos da administração pública.
Na decisão, o magistrado a quo aduz que os representados Abib Miguel, José Ary Nassif e Claudio Marques da Silva agiam em conluio e promoviam a nomeação dos cargos comissionados (desviando por conseguinte os vencimentos correspondentes), tendo em vista os cargos que exerciam, respectivamente, de: diretor-geral, diretor da administração e diretor de recursos humanos (f. 4 da decisão originária, f.
106/TJ).
Diretamente subordinado a Abib Miguel estava João Leal de Mattos, o qual coordenaria um núcleo de familiares que exerciam também cargos comissionados fantasmas.
Dentre estes familiares estaria a paciente, que é filha de João Leal de Mattos.
Contudo, não há referência, tanto na decisão que decretou a prisão temporária (fs. 103/114/TJ), quanto na representação formulada pelo Ministério Público (fs. 17/56/TJ) da relevância específica da constrição cautelar da paciente, eis que ela não é apontada como integrante do `núcleo' apontado como mentor dos crimes (a que pertenceriam Abib Miguel, José Ary Nassif e Claudio Marques da Silva) ou à angariação de fantasmas (como João Leal de Matos) ou ao gerenciamento do produto dos desvios e eventual `lavagem'.
Também não há menção de que a paciente tivesse acesso a provas e estivesse adulterando-as (vez que há referência à continuidade da edição de novos `diários secretos' com exoneração de funcionários fantasmas com datas retroativas), pois supostamente ela nunca teria frequentado a Assembleia Legislativa.
Enfim, não há indicação de que a paciente tenha conhecimento de fatos relevantes às investigações, de modo a justificar a decretação da sua prisão temporária fundada no inciso I do art. 1º da Lei 7960/89.
Diante do exposto, conclui-se que não basta a imputação da prática ou participação em algum dos crimes elencados no inciso III do art. 1º da Lei 7960/89, mas também a caracterização das hipóteses previstas nos incisos I ou II do mesmo dispositivo.
Habeas corpus nº 672.927-7
E no caso específico da paciente Priscila da Silva Matos isto não ocorreu, na decisão questionada, que decretou a sua prisão temporária.
Por isso, defiro a liminar, para o fim de suspender a prisão temporária decretada em face da paciente, expedindo-se alvará de soltura, salvo se por al não estiver presa.
3.
Oficie-se ao Juízo impetrado, comunicando a concessão da liminar, para que lhe dê imediato cumprimento, bem como para que preste as informações que reputar relevantes ao deslinde deste HC, no prazo de cinco dias.
Autorizo o Sr. Chefe da Seção a firmar o ofício, que deverá ser instruído com cópia desta decisão.
4.
Após, encaminhem-se os autos à D. Procuradoria Geral de Justiça, para que ofereça parecer.
Curitiba, 26 de abril de 2010.
LILIAN ROMERO 1 Juíza de Direito Substituta em Segundo Grau
1 Em substituição ao Desembargador José Maurício Pinto de Almeida.



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Não vale como certidão ou intimação.

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